terça-feira, 13 de setembro de 2011

Nem tão normal assim...

Quando eu tinha 14 anos um sujeito me seguiu no caminho da escola para casa. Eu era uma menina atraente e paquerada. Mas era exatamente isso: uma menina. Eu percebi o que estava acontecendo. Mas a lembrança de uma cena de constrangimento sofrida por outra menina noônibus, ao reclamar das, digamos,  carícias não solicitadas de um sujeito, me fez ter medo de buscar ajuda. Tentei despistá-lo, não queria que soubesse onde eu morava. Saltei do ônibus num ponto diferente do meu. Erro. Ele desceu junto e me agarrou. Lembro do sol forte, de olhar em volta e não ter ninguém perto, dele tentando me dominar.  Lutei e bati com toda a força que pude. Gritei. Ele vacilou e eu corri. A vantagem foi sufuciente para alcançar uma área segura: a quitanda do Seu Antônio. Entrei lá desesperada, gritando, envergonhada e com medo. Não queria ter que explicar o que tinha acontecido. Vergonha. Medo de ser acusada de algo qu eu nem sabia o que era. Mas falei o que tinha acontecido e ele e outros que estavam perto saíram para tentar encontrar o tal sujeito.
Eu fiquei alí, sentada no meio dos caixotes de verduras e frutas, chorando baixinho. Eles voltaram sem ter conseguido pegar o tal sujeito. Seu Antônio destacou o filho mais velho para me levar até em casa. Me lembro que meu pai, talvez por estar tão assustado quanto eu, me falou: você deve ter feito alguma coisa... Eu só precisava de um abraço. E não veio. Nunca. Nem desculpas. Isso mudou significativamente a minha forma de ver o mundo. Diminuiu minha alegria, minha espontaneidade e meu sorriso. Mas eu levei a vida em frente e meio que dei um jeito de arrumar os pedaços com jeitinho.
Hoje, voltando correndo para o trabalho, sem ter almoçado, decido parar no Supersucos e comprar uma vitamina como costumo fazer. Cumprimento aos funcionários, como sempre. Pego a ficha e vou para o balcão fazer o pedido. Enquanto espero, um dos donos, Seu Garcia, acho que é esse o nome, se aproxima. Pergunta se já fiz o pedido e respondo que sim. Me pergunta se está tudo bem, respondo que sim, agradeço e pergunto: E o senhor, com vai? Ele responde: melhor agora.  E, de imediato, começa a tocar em mim. Alí no meio de todos, ele me pressiona e tenta me abraçar como se em algum momento eu tivesse dado a ele o direito de me tocar. De me tocar com intimidade. Me sinto acuada, mas não quero um escândalo. Respiro fundo e me desvencilho dele. A vontade de chorar e gritar de raiva. De mandar a mão na cara dele. Raiva. Muita. Lá no fundo, as palavras de meu pai ecoando: você deve ter feito alguma coisa... Não, eu não fiz. Sei disso. A única coisa que fiz foi responder de maneira educada a uma pergunta. Foi cumprimentá-lo a cada vez que , nos últimos 7 anos, entrei ali para comprar algum lanche, assim como faço com todos os que trabalham no local.
Voltei para o trabalho e a única coisa que falei para minha colega foi: ele foi longe demais. E fui tomada por uma tristeza profunda, uma dor que esperava não sentir nunca mais.
Não foi uma paquera, não foi um flerte. Foi uma agressão.
E a minha vida, mais uma vez, deixou de ser normal. Agora tenho mais um buraco na alma para fechar...