sábado, 28 de novembro de 2009

Sonhos

Passei um tempo enorme sem me lembrar dos meus sonhos. É. Afinal, todo mundo sonha, apenas não se lembra disso ao acordar. Comecei a achar que nunca mais saberia o que é sonhar. Isso me causava muita angústia porque, para mim, sonhos são um dos maiores registros que a gente tem de estar vivo. Emocionalmente vivo. 
Mais ou menos 2 semanas atrás, registrei que estava sonhando e, imediatamente ao acordar, anotei cada detalhe de que me lembrava. Fiquei tão maravilhada e feliz, tão encantada que  quase não cabia em mim de alegria. Na mesma hora, senti medo. Medo de ser apenas um pequeno momento em que relaxei o suficiente para permitir ao meu inconsciente "brincar".
Mas, com intenso prazer, acordo a cada dia com mais lembranças de sonhos. E, ainda que alguns não sejam muito bons, para mim são inestimáveis. São um claro sinal de que eu estou voltando a ser feliz.

quinta-feira, 5 de novembro de 2009

Camba, Elisa!


No final de 2005, eu tinha acabado de fazer uma cirurgia de redução de estômago para me livrar de 150 quilos e estava entediada, quando me interessei pelo projeto do Brasil1. Vela sempre tinha sido uma realidade distante para mim, menina nascida e criada no subúrbio do Rio de Janeiro, onde o esporte dominante era o futebol e, no máximo, andar de bicicleta por horas a fio. Comecei a ler sobre iatismo, a me inteirar da Volvo Ocean Race e uma nova paisagem foi se abrindo. De repente, os livros que eu lera sobre expedições, sobre as travessias de Amyr Klink, o nome da família Grael, tudo tomou outra dimensão. Foi nesse ponto que comecei a sonhar. A sonhar com o dia em que velejaria, em que estaria em um daqueles barquinhos de vela branca que eu via ao longe na Baía de Guanabara.
Na primeira vez em que entrei num veleiro, minhas pernas tremiam tanto que o balanço do mar era bobagem. Logo percebi que iria gostar muito de fazer aquilo. Fiquei ali, quieta, tentando não atrapalhar as manobras e me deliciando com o vento no meu rosto, com a sensação de encantamento, liberdade e paz. Nesse dia, ainda muito acima do peso, eu não me via como nada além de uma convidada num passeio de barco.Nem nos meus melhores sonhos imaginei que um dia estaria a bordo de um veleiro como tripulante.
Quando voltei a terra percebi que queria mais. Para isso sabia que seria importante perder peso, adquirir força física e, obviamente, entender um pouquinho da mecânica da coisa. Aos poucos, sem pressa, fui me preparando física e mentalmente, aprendendo um pouquinho de teoria, observando a prática sempre que era convidada a passear. O primeiro convite para participar oficialmente de uma tripulação veio do querido Morcegão, quando me convidou para correr uma regata, e foi aceito com imensa alegria. Lembro que saí do bar do Adão flutuando no meio da chuva, com um sorriso daqueles de orelha a orelha. Para meu azar, uma crise de sinusite adiou meu sonho. E no meio de muitas lágrimas tive que "tirar meu time de campo".
O tempo foi passando, regatas virtuais também, muitos passeios, o convívio no Boteco... O peso diminuindo, a vida mudando... Eis que, um dia, estou no barco de amigos e recebo a ordem: Elisa, prepara pra cambar. Ainda me lembro do coração disparado, do medo de  errar e estragar tudo. Depois, a sensação deliciosa de ter feito tudo certo, a alegria por estar concretizando um sonho.
Alguns dias atrás, saí com esses mesmos amigos. Dia agitado aqui no Rio, com até 15 nós de vento. Tinha planejado ir, como costumo dizer, "de madame" e só curtir o passeio. Mas os planos eram outros. De uma hora para outra estava de tripulante novamente. Envergando a camisa do Boteco, ouvi o berro: Camba, Elisa!
Nesse dia, voltei arrebentada para o clube. As mãos doloridas e inchadas de quem encarou sem luvas toda a faina daquele dia, simplesmente porque não teve tempo hábil para apanhá-las na mochila. Mas a leveza do meu coração compensava todo o desconforto. E eu só pensava: quero mais, sempre!
A minha alegria foi registrada em vídeo por um dos meus amigos. Sempre que assisto aquelas cenas - e agradeço ao Wietze por ter cortado os meus dois tombos -, tenho vontade de estar lá novamente, ouvindo o barulho do vento, sentindo o barco ganhar velocidade, manobrando rapido a cada rondada.

Hoje, se tivesse que descrever um dia perfeito, certamente incluiria a vela entre as aitividades desse dia. Falo de velejar com a mesma paixão com que falo e torço pelo Flamengo. E fico sempre esperando ouvir o grito: Prepara prá cambar!
Mas... quem tornou isso possível? Quem trouxe esse mundo até minha vidinha tão normal? O anárquico, liberal, improvisado, não-burocrático Boteco 1.  Esse Boteco que amo tanto e do qual tenho estado afastada, só observando de longe. Boteco que sempre achei que fosse extensão da minha casa, mas que anda tão tumultuado, tão conturbado, que as coisas bacanas que estão acontecendo acabam ficando em segundo plano e o  que deveria ser comemoração perde lugar para discussão, questionamentos, decisões sobre "rumos", acusações de panelinha... Aí eu vou até o site e olho o estatuto... Me lembro da alegria com que um dia cantamos Um lugar do caralho, do Raul Seixas e cogitamos transformar essa música no hino do Boteco... Entendo que exista a necessidade de alguns de buscar algo mais profissional no mundo da vela. Mas o Boteco1 não é profissional.  Confesso que até cogitei muitas vezes a exploração da marca que, todos sabemos, alcançou uma posição respeitável no meio náutico. Mas... não! Meu sentimento, hoje, é o de que devemos manter o Boteco 1 como ele é. Talvez com um pouco de organização e divisão de responsabilidades uma vez que há a necessidade de manter nosso ponto de encontro virtual que é o site. Isso sem mudar a característica que o tornou conhecido: ser uma improvável torcida de vela perdida no meio do país do futebol.